O Mensageiro dos
Orixás
O PERFIL DO ORIXÁ Exu é a figura mais controvertida dos
cultos afro-brasileiros e também a mais conhecida. Há, antes de mais nada, a
discussão se Exu é um Orixá ou apenas uma Entidade diferente, que ficaria entre
a classificação de Orixá e Ser Humano. Sem dúvida, ele trafega tanto pelo mundo
material (ayé), onde habitam os seres humanos e todas as figuras vivas que
conhecemos, como pela região do sobrenatural (orum), onde trafegam Orixás,
Entidades afins e as Almas dos mortos (eguns).
Esse Orixá (ou Entidade) não deve ser confundido com os
eguns, apesar de transitar na mesma Linha das Almas (uma das três linhas
independentes) sendo o seu dia a segunda-feira; ficando sob o seu controle e
comando, os Kiumbas (espíritos atrasadíssimos na evolução).
Exu é figura de status entre os Orixás, que apesar de ser
subordinado ao poder deles, constitui uma figura tão poderosa que
frequentemente desafia as próprias divindades. Sua função e condição de
figura-limite entre o astral e a matéria, se revela em suas cores, o negro e o
vermelho, sendo esta última a vibração de menor frequência no espectro do olho
humano, abaixo do qual tudo é negro, há ausência de luz.
Seus aspectos contraditórios também podem ser analisados sob
outro ponto de vista: o negro significa em quase todas as teologias o
desconhecido; o vermelho é a cor mais quente, a forte iluminação em oposição à
escuridão do negro. Até em suas cores, Exu é o símbolo das grandes
contradições, do amplo terreno de atuação.
Os Exus são considerados entidades poderosas, mas nem sempre
conscientes dessa força, desconhecendo seus limites e suas conseqüências ao
envolver os seres humanos vivos. Assim ao utilizar-se de suas vibrações, um
iniciado precisa tomar cuidado para não permitir que Exu, mesmo com o propósito
de ajudá-lo, provoque um descontrole energético que possa ser prejudicial ao
ser humano.
Sua função mítica é a de mensageiro - é o que leva os
pedidos e oferendas do homens aos Orixás, já que o único contato direto entre
essas diferentes categorias só acontece no momento da incorporação, quando o
corpo do ser humano é tomado pela energia e pela consciência do seu Orixá
pessoal (quando a consciência de quem carrega o Orixá desaparece).
É Exu quem traduz as linguagens humanas para a das
divindades. Por isso, é imprescindível para a realização de qualquer ritual,
porque é o único que efetivamente assegura em uma dimensão (ayé ou orum) o que
está acontecendo na outra, abrindo os caminhos para os Orixás se aproximarem
dos locais onde estão sendo cultuados.
O poder de comunicar e ligar, confere à ele também o oposto;
a possibilidade de desligar e comprometer qualquer comunicação. Se possibilita
a construção, também permite a destruição. Esse poder foi traduzido
mitologicamente no fato de Exu habitar as encruzilhadas, passagens, os
diferentes e vários cruzamentos entre caminhos e rotas, e ser o senhor das
porteiras, portas entradas e saídas. Isso não entra em contradição com o fato
de Ogum, o Orixá da guerra, ser considerado o senhor dos caminhos. Além da grande
afinidade entre as duas figuras míticas (que são irmãos, de acordo com as
lendas), Ogum é responsável pelo desbravamento, pelo desmatar e o criar de
novos caminhos, pela expansão do reino, enquanto Exu é o senhor da força que
percorre esses caminhos.
Como, então, essa imagem de menino brincalhão, mesmo que
imprudente, se coaduna com a imagem popular que associa Exu ao Diabo? Mesmo em
cultos de Umbanda (alguns) Exu é freqüentemente considerado um representante do
mal, das forças perigosas e não totalmente recomendáveis.
Qual a visão está correta?
A rigor, ambas ou nenhuma delas. Exu realmente brinca e se
diverte, possibilitando brincadeiras e prazeres aos seres humanos. Também mexe
com forças terríveis, provoca acontecimentos dramáticos, causando o mal.
Em termos históricos, as culturas africanas que cultuam os
Orixás - muito diversificadas, conseqüência evidente de uma sociedade dividida
em raças, tribos, muito pouco centralizada para os parâmetros ocidentais - são
muito mais antigas que as que conhecemos. Há lendas de Orixás que se explicam
como respostas socialmente criativas a acontecimentos perdidos num longínquo
passado, como a substituição do matriarcado pelo patriarcado, o surgimento do
primeiro conceito de sociedade agrária, em oposição a uma cultura nômade e
caçadora.
Assim, como encontrar uma figura que representa o mal numa
cultura onde não existe a dicotomia bem-mal? A moralidade ou imoralidade
portanto, não está nas figuras dos Orixás, nem principalmente em Exu, mas sim
nas interpretações que nós, ocidentais, fazemos a respeito de seus desígnios.
Para a cultura africana, politeísta, onde os deuses brigam
entre si, cada um tomando atitudes radicalmente opostas às dos outros, não
existe um certo e um errado, mas vários. Cada ser humano é filho de dois Orixás
e, para ele, suas atitudes serão as mais corretas, enquanto um filho de outro
Orixá deverá manter postura diferente, mas adaptada ao arquétipo de
comportamento associado ao seu próprio Orixá.
Outra razão de confusão vem do fato de os negros terem
chegado ao Brasil na condição de escravos, tratados como subumanos e sem os
mínimos direitos.
Nenhuma hipótese havia, portanto, para que Exu e outras
figuras míticas do Candomblé e da Umbanda, fossem aceitas como independentes:
os negros tinham de ser convertidos ao Deus Único, aos mitos cristãos.
Uma divindade africana ao ser capturada pelas explicações
católicas, teria no máximo o status de santo, divindade menor, praticamente
humana, na teologia cristã.
Como precisavam de um Diabo, os jesuítas encontraram na
figura de Exu, o Orixá que poderia, meio forçadamente, vestir a sua roupa,
provavelmente porque sendo o mais humano dos Orixás, à ele se pede
interferência nas questões mais mundanas e práticas, o que resulta que a maior
parte das oferendas do culto vá, para ele.
Exatamente por isso, Exu era a divindade que protegia, na
medida do possível, os negros dos repressivos senhores. Era para Exu que pediam
desgraças para seus senhores.
Dois outros fatores associam Exu ao Demônio; o fogo -
elemento do Diabo e também freqüente nos cultos e oferendas para o mensageiro
dos Orixás africanos - e o sexo, território considerado tabu pelos católicos, e
o prazer - em geral, as atividades favoritas de Exu. A sensualidade desenfreada
costuma ser atribuída à influência de Exu, que significa a paixão pelo gozo,
sendo freqüentemente representado em estatuetas, como figura humana sorridente,
debochada.
Para completar os tabus que marcavam Exu como uma figura que
subvertia o conceito de faça o bem e será recompensado, faça o mal e será
punido - já que ele podia fazer qualquer coisa e alterar qualquer resultado -
mas um fator fez com que fosse não só usado como o Diabo mas reconhecido como
sua própria encarnação por parte dos jesuítas: Exu gosta de sangue.
É costume que, em oferendas, o sangue de animais seja o
último ingrediente.
Como, porém, essa base filosófica africana foi esquecida na
prática pelos brasileiros, existe certo temor e preconceito com relação a Exu.
Isso se revela no temor que os babalorixás (sacerdotes que dirigem a Umbanda ou
um Candomblé) têm em identificar alguém como filho de Exu, ou seja, como
pessoas cuja energia básica é a mesma do mensageiro dos deuses. Reforçam-se
assim, os mitos de desgraça que ronda a figura de Exu.
A Pomba-gira, figura comum nos cultos de Umbanda e presente
em diversos Candomblés, dada a grande intercomunicação entre as duas vertentes,
não passa, de um Exu Feminino, onde estão em destaque o senso de humor
debochado, a voluptuosidade e sensibilidade desenfreadas, usando cabelos
soltos, saias rodadas e vaidosas flores na cabeça. Sua dança é uma gira
frenética, desenfreada, violenta até, com quase nenhum controle - sem
compostura, de acordo com a visão ocidental.
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